sábado, 2 de outubro de 2010

RAIMUNDO DOS PASSOS

Estava sozinho no mundo. Não era como não tivesse amigos ou família, os tinha, mas eles diferenciavam de mim de alguma forma. Não era infeliz por isso, ser só tem seus benefícios. Eu era um e assim seguia a minha vida. Até o dia que o conheci.
Estava no campus de veterinária na UFF, o dia não lembro, mas era quinta-feira. E o que importa se era quinta-feira? Uma palavra Churrasquinta. Churrasquinta como alguns conseguiram deduzir, e outros não, é uma espécie de tradição da faculdade de Veterinária da UFF de marcar churrascos quase toda quinta-feira. Estava eu lá, deitado perto da churrasqueira. Como de costume chegava muitas horas mais cedo ao local da festa e dormia, ou fingia, e quando levantava a festa já haveria começado e eu não precisaria pagar os dez reais da entrada. Sempre deu certo, em três anos de UFF não colaborei com nenhuma churrasquinta. Não que me orgulhe disso,..., pensando bem, me orgulho sim.
Mas aquela quinta-feira em questão foi diferente, pois como já o disse, o conheci. Estava fingindo dormir quando ele entrou enfurecido na área de festa. Me sentei, enquanto ele, que nem havia ainda notado a minha presença gritava contra algum cliente da clínica de veterinária da UFF. Eu mesmo já havia trabalhado lá um tempo. Eu odiava a maior parte dos meus clientes. Os motivos aqui não interessam, mas eu compartilhava da dor dele. Resolvi lhe dirigir a palavra.
O que lhe dissemos um ao outro é irrelevante. A inicio ele notou a minha presença mas parecia me desprezar, é, até hoje, uma pessoa muito rígida, e não deu sinais que ia me responder. Com um pouco de insistência fiz ele me contar qual loucura o cliente a qual atendia queria agora. Em resumo uma madame em processo de separar do marido queria fazer eutanásia em uma cadela completamente saudável por um motivo qualquer. Me levantei e fui lá. Entrei na sala e peguei a ficha da cadela com o nome da madame. Não fiquei para ouvir, mas da boca da madame saia mais veneno que de qualquer cobra que já tenha visto. Com acesso a internet e sabendo onde procurar consegui localizar o marido dela e liguei para ele. Em menos de meia hora ele estava lá. Não fiquei para ver o desenrolar dos acontecimentos, tinha que voltar para o meu leito. Dessa vez adormeci de verdade.
Acordei e ele estava lá. A festa já havia começado. Ele estava com duas latas de cerveja ao seu lado, me deu uma e agradeceu. Detesto cerveja, mas não quis fazer uma desfeita. Afinal ele não me parecia o tipo de pessoa acostumada a agradecer. Bebemos e conversamos, ao meu ver ele era demasiadamente sério. Ao seu olhar eu, provavelmente, parecia imaturo. Mas nos demos bem. E no restante do tempo que continuei na faculdade de veterinária eu não estive mais só.

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